A viagem foi idealizada e chefiada pelo médico e naturalista Georg Heinrich von Langsdorff, estabelecido no país desde 1813 como cônsul-geral da Rússia no Rio de Janeiro. Langsdorff era membro-correspondente da Academia Imperial de Ciências de São Petersburgo e tinha integrado uma viagem de circunavegação promovida pelo governo russo, ocasião em que aportou no litoral de Santa Catarina. Por ter vivido em Lisboa, tinha domínio do idioma português.
No Brasil, Langsdorff transformou sua propriedade, a Fazenda Mandioca, num importante polo de encontro entre cientistas e artistas europeus. Situada ao fundo da Baía de Guanabara (hoje município de Magé, no Rio de Janeiro), a fazenda tinha localização estratégica para quem pretendia viajar ao interior do país. Langsdorff disponibilizava para as pesquisas de seus hóspedes uma grande biblioteca científica, um herbário, jardim botânico e coleções zoológicas e minerais.
A ideia de fazer uma viagem científica exploratória ao interior do Brasil foi defendida com entusiasmo por Langsdorff junto ao governo russo, que concordou em financiar o projeto. Para acompanhá-lo, Langsdorff contratou um artista, o alemão Johann Moritz Rugendas, além de cientistas como o botânico Ludwig Riedel, o astrônomo Néster Rubtsov e o zoólogo e linguista Édouard Ménétries. Este grupo percorreu o interior de Minas Gerais entre 1824 e 1825, numa primeira etapa da viagem.
No entanto, desentendimentos entre Langsdorff e Rugendas levaram o artista a desligar-se da expedição. Para a segunda etapa da viagem, Rugendas foi substituído pelos artistas franceses Hercule Florence e Aimé-Adrien Taunay (filho de Nicolas-Antoine Taunay). Transitaram vias fluviais entre Porto Feliz – às margens do Tietê em São Paulo – e Cuiabá e, de lá, até Belém do Pará. Nesta etapa, a expedição contou ainda com a presença de Wilhelmine von Langsdorff, esposa de Langsdorff e única mulher a viajar com o grupo.
Foram percorridos, entre 1825 e 1829, cerca de 17 mil quilômetros. Dois incidentes marcaram fortemente a segunda parte da viagem: Adrien Taunay morreu afogado ao tentar atravessar o Rio Guaporé́ e Langsdorff, vítima de doenças tropicais, perdeu a memória.
Grande parte do material produzido durante a expedição foi reunido por Hercule Florence e enviado para a Rússia: manuscritos, desenhos, aquarelas, mapas, espécies minerais, herbários, animais empalhados, registros de línguas indígenas e correspondências. Também fazem parte deste acervo os diários de Langsdorff, que revelam detalhes sobre os costumes e a língua de tribos como os Apiacás, Mundurucus e Guanás, estes, registrados por Florence.
A Viagem Pitoresca através do Brasil
Rugendas, então com 19 anos, aceitou engajar-se no projeto de Langsdorff, provavelmente inspirado pelos relatos de viagem de Spix e Martius e pela obra de Thomas Ender, integrantes da Missão Austríaca. Durante os dois anos em que aguardou o início da expedição, adiado pelo processo de independência do Brasil, o artista registrou paisagens, fauna e flora dos arredores do Rio de Janeiro, cenas urbanas e personagens locais. Rugendas é autor de um dos conjuntos iconográficos mais importantes sobre o Brasil do início da década de 1820.
Não se sabe ao certo o itinerário cumprido pelo artista após desligar-se da expedição em 1824. De Minas Gerais, provavelmente passou pela Bahia e Pernambuco antes de retornar à Europa. Levou consigo grande parte de seus desenhos e anotações, que apresentou a Alexander von Humboldt, o maior cientista europeu da época, quando chegou a Paris. Humboldt sugeriu que o artista publicasse um livro de viagens, conseguindo que o projeto fosse levado a cabo pela importante casa editora Engelmann.
As litografias baseadas em desenhos que Rugendas produziu no Brasil foram publicadas em Voyage Pittoresque dans le Brésil [Viagem Pitoresca através do Brasil] entre 1827 e 1835. O livro é, até hoje, um dos mais conhecidos de viagem ao Brasil do século XIX. A publicação, com edições em alemão e francês, fez sucesso na época, inclusive em terras nacionais, embora hoje se possa perceber a representação europeizada dos negros escravizados e índios.
Ainda incentivado por Humboldt, Rugendas empreendeu nova viagem à América, que durou 15 anos. Viajou pelo México, Chile, Peru, Bolívia, Argentina e Uruguai, passando novamente pelo Rio de Janeiro em 1846. Pintou retratos para a família imperial, foi condecorado por dom Pedro II com a Ordem do Cruzeiro do Sul, e participou das Exposições Gerais de Belas Artes a convite de Felix-Émile Taunay, com quem tinha estabelecido uma amizade na primeira vez em que esteve no Brasil. Rugendas voltou para a Europa no ano seguinte, em 1847.